domingo, 21 de março de 2021

Grahas orientais e ocidentais em relação a Sūrya (Sol)

Na astrologia helenística e medieval considera-se que um graha oriental em relação a Sūrya (Sol) é mais forte do que um ocidental em relação ao mesmo. Um graha oriental seria aquele que ascende no céu antes de Sūrya, ou seja, está em grau ou signo anterior. Já o ocidental é o contrário, ele ascende depois de Sūrya, i. e., está em grau ou signo posterior.

A ideia é de que um graha oriental, justamente por ascender antes de Sūrya, seria mais vigoroso e jovial, ao passo que o graha ocidental, por ascender mais tarde, seria mais fraco. No jyotiṣa, no entanto, a impressão que se tem inicialmente é de que esse conceito não foi levado em conta, já que ninguém fala a respeito disso, seja na modernidade ou na literatura clássica.

Porém, esse é um ledo engano, pois na verdade há sim citações clássicas a respeito do conceito. Certa vez, quando estava revisando todo o conteúdo do Jātaka pārījāta para criar um resumo geral, eu encontrei um verso que falava exatamente sobre esse assunto da orientação dos grahas em relação a Sūrya. Vaidyanātha diz (2.70) que os grahas que antecedem Sūrya longitudinalmente estão com a face para cima (supino) e são capazes de produzir felicidade e riqueza, enquanto aqueles que estão em graus posteriores ao dele, estão com a face para baixo (de bruços) e seriam menos produtivos e eficazes. Em outras palavras, Vaidyanātha está falando sobre grahas orientais (com a face para o alto) e ocidentais (com a face para baixo) em relação a Sūrya, exatamente o mesmo conceito usado na tradição helenística e medieval de astrologia.

Mas não foi só essa referência que me fez perceber a presença desse conceito na tradição indiana. Um estudo da Sārāvalī, particularmente dos versos que falam sobre os Sūrya yogas, veśi e vośi, deixaram claro para mim que havia na tradição consciência a respeito desse elemento de delineação.

Kalyāna, autor da Sārāvalī, diz o seguinte em relação ao veśi yoga (14.3-5) formado por Śukra (Vênus) e Budha (Mercúrio):

Se Śukra ocupa a dois de Sūrya, isso torna o indivíduo tími­do, impõem obstáculos ao longo de seu caminho, o faz derrotado e dado a se mover de uma forma agradá­vel; Budha o faz um servo, sujeito a penúrias, modesto, tímido e de uma fala mansa.

Em relação ao vośi yoga, Kalyāna diz (14.7-9):

Śukra na doze de Sūrya torna o indivíduo corajoso, famoso, virtuoso e detentor de uma boa reputação; Budha o faz se expressar de uma forma doce, o torna belo e obediente.

Note que as descrições de Budha e Śukra na dois de Sūrya são predominantamente negativas, ao passo que as descrições desses na doze de Sūrya são positivas. No caso, os grahas na dois ficam ocidentais em relação a Sūrya, enquanto os na doze, orientais. Por isso Kalyāna pontua que Śukra e Budha na doze de Sūrya conferem melhores resultados do que na dois.

Com essas referências, está mais do que claro que o conceito da orientação dos grahas em relação a Sūrya já era conhecido na tradição indiana. Mesmo Kalyāna não tendo citado diretamente essa ideia, como fez Vaidyanātha, fica implícito nos seus versos que ele tinha consciência desse elemento. Inclusive, é importante citar que Kalyāna é do século X, ou seja, viveu cinco séculos antes de Vaidyanātha.

Dadas essas explicações, veja agora dois exemplos notáveis de vośi yogagraha oriental em relação a Sūrya:

 

O mapa acima pertence ao imperador Dom Pedro II. Note que Śukra (Vênus) está na doze de Sūrya nesse mapa, dignificado e ocupando o lagna, enquanto lagneśa (senhor do ascendente). Ou seja, esse é um caso de vośi yoga, ou de Śukra oriental. Esse posicionamento, obviamente somado a muitas outras configurações, contribuiu para que Dom Pedro II viesse a ser o imperador do Brasil.


Esse é o mapa de Silvio Santos, que conta com Śukra também oriental em relação a Sūrya – vośi yoga. Notavelmente, Śukra é regente de dois e nove ocupando a dois. Além de dignificado, Śukra também está retrógrado (śaktāvasthā – uma condição ponderosa), o que fez de Silvio Santos um homem muito rico.

Agora veja um exemplo notável de veśi yoga - graha ocidental -, também envolvendo Śukra:


O mapa acima é da Christiane F., que conta com Śukra na dois de Sūrya – veśi yoga. Na descrição de Kalyāna, o indivíduo com esse yoga é tímido, tem seu caminho marcado por obstáculos e é derrotado. Já com 13 anos a Christiane estava viciada em heroína e tendo de se prostituir para manter os seus vícios. Além disso, mesmo depois de ter ganhado popularidade e auxílios diversos, ela nunca conseguiu ficar mais do que alguns meses distante da heroína e, hoje, embora esteja seguindo um tratamento a base de metadona, ela sofre com o alcoolismo, está com hepatite C, cirrose hepática e, esporadicamente, ainda faz uso da heroína. Claro que só essa configuração de Śukra não decidiu esse destino difícil dela, mas sem dúvida alguma essa é uma das configurações que contribuiu, especialmente por Śukra ser o dispositor de Sūrya, que é também o seu lagneśa (senhor do ascendente).

Conclusão

O conceito da orientação dos grahas em relação a Sūrya é útil, enquanto ferramenta complementar de análise de força e eficiência. Se um graha está oriental, inicialmente devemos considerá-lo mais eficaz e produtivo do que um graha ocidental. Porém, esse não é um conceito que encerra o julgamento da condição de um graha, senão que adiciona alguma informação, a qual deve ser comparada com todas as outras informações que o mapa ou um posicionamento isolado nos apresenta.

 

oṁ tat sat

2 comentários:

  1. Boa noite! Primeiro de tudo, gostaria de desejar felicitações ao blog pois estudo astrologia jyotish desde 2015 e com o pouco conteúdo em português pela internet, acabei descobrindo esse blog! Conteúdo incrível e estou lendo tudo! <3

    Porém tem uma duvida a respeito de um post seu pois não entendi bem, (http://bhavakendra.blogspot.com/2012/09/ashtakavarga-como-usar-tecnica.html) nele a casa 11 tem que ter pontuação maior que a casa 10 e 12 para asegurar riqueza não é? E quando a casa 10 e 12 tem a mesma pontuação mas a 11 é maior? Exemplo:

    casa 10: 28
    casa 11: 40
    casa 12: 28

    Ainda existem chances de uma boa vida? Aguardo resposta pois não sei como interpretar.

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  2. Olá, essa postagem não é do meu blog, mas sim do blog do Tony. Minha experiência pessoal com o ashtakavarga me levou e desistir da técnica. Ela é coerente em alguns momentos e incoerente em muitos outros. Cheguei a conclusão de que toda técnica em jyotisha que se propõem matemática é no máximo uma aproximação imperfeita da realidade. Se tiver dúvidas, vide as técnicas que tentam decifrar a longevidade por cálculos, ou que visam definir a força dos grahas só com base em números.

    A astrologia é essencialmente simbólica e tentar definir resultados só com base em numerações embora seja tentador, já que ofereceria uma resposta fácil aos problemas, na prática decepciona muito.

    Att,
    Goura Hari dasa

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