Um tema que gera muitas dúvidas é este:
a vida espiritual existe à parte do mapa, ou é algo que também estudamos por
meio do mapa? Bem, a resposta para isso, na minha humilde opinião, pode ser
encontrada se seguimos três passos: (1) uma investigação filosófica sobre tattvas
(verdades) fundamentais, tomando por referência os śrutis e smṛtis
(os textos védicos); (2) a busca por referências sobre vida espiritual nos
textos clássicos de jyotiṣa; (3) a observação direta dos mapas de sādhakas
(praticantes espirituais) e siddhas (santos, as almas
autorrealizadas).
Em relação ao primeiro passo
da nossa investigação, é notável que o kāla/daiva (tempo/destino) é
referido no Bhagavata-purāṇa,
o comentário natural ao Vedānta-sūtra, como imutável. Isso é
consubstanciado por várias passagens do Rāmāyaṇa, Mahābhārata, Bhagavad-gītā
e das Upaniṣads. Na Gītā, por exemplo, os versos 5.8-9, 5.14,
13.20, 13.30, 13.32 etc., são alguns exemplos onde se esclarece que todas as
ações realizadas dentro da realidade material são produto de prakṛti/traiguṇya
(a natureza fenomênica/os três guṇas), e não do ser vivo (jīva).
Há também versos como 2.14 que esclarecem como a experiência da dualidade dentro
dessa realidade é inevitável e deve ser tolerada, ou seja, não há como
controlarmos o destino ao nosso bel-prazer. Ao invés de estimular o controle sobre a
natureza, o vedānta nos ensina a importância de se cultivar o desprendimento
e a equanimidade (frutos naturais do sacrifício espiritual) como um meio de não
se deixar afetar pelas dualidades (alegrias e tristezas, honra e desonra etc.)
do mundo, visto que essas não têm relação alguma com a alma nem a afetam. Ou seja, a mensagem do vedānta é sobre curvar-se perante a
realidade, ao invés de chocar-se com ela. Dada a natureza transcendental da alma, não há porque se
deixar abalar pelas experiências transitórias e naturais deste mundo.
Em vista dessas
afirmações todas dos śāstras, fica evidente que qualquer movimento
realizado dentro do mundo material é oriundo da ação dos guṇas, logo,
ele precisa se expressar dentro de suas leis. Por exemplo, se eu me
dedico a realizar uma peregrinação, um ato espiritual, para isso eu preciso
usar o meu corpo, a minha mente etc., logo, essas ações todas também precisam
estar representadas nos símbolos astrológicos, os quais abordam justamente os guṇas/prakṛti
que envolvem tanto os aspectos materiais densos (o corpo) quanto sutis (a
mente, o intelecto e o falso-ego/ahaṅkāra). Essa mesma lógica se aplica
a qualquer outro tipo de ação voltada para o âmbito espiritual.