Como eu devo analisar os trânsitos dos grahas?

Trânsitos são um grande interesse do público geral, mas há uma série de coisas que alguns não sabem o quão importantes são para que um trânsito seja realmente relevante. Afinal, todos os trânsitos tem impacto – algo que alguns, mais radicais, também não aceitam, embora seja um fato –, mas nem todos são tão relevantes.

Quando o astrólogo analisa um mapa, nele ele vê múltiplas promessas, mas dentro de um formato atemporal, ou seja, você sabe que a pessoa vai se casar, divorciar e casar de novo, mas essas coisas não vão acontecer ao mesmo tempo, afinal, isso nem sentido faz. Aí é que entram as técnicas de tempo simbólico, que no jyotiṣa nós chamamos de daśās. As daśās funcionam como gatilhos que ativam eventos dentro de uma faixa X de tempo. Logo, há daśās que favorecem casamentos, outras que favorecem divórcios, e o astrólogo deve ser capaz de diferenciar uma coisa da outra para poder prever eventos distintos, mas prometidos no mapa.

Uma vez que o astrólogo sabe usar das daśās para prever eventos, ele deve confirmar esses eventos por meio dos trânsitos. Tanto as daśās quanto os trânsitos são técnicas de predição, mas de naturezas distintas, pois a daśā lida com um tempo simbólico – p. ex.: “fulano vive a daśā de Júpiter, que dura 16 anos, depois entra na daśā de Saturno, que dura 19 anos” –, ao passo que o trânsito lida com um tempo real – p. ex.: “Saturno vai estar passando por aquário até 2025, logo, ele vai afetar X casa do seu mapa até lá”. Essas duas técnicas de predição são interdependentes, pois se ignoramos uma delas, automaticamente diminuímos muito a nossa precisão preditiva.

Um exemplo pode ajudar vocês a entenderem bem como isso funciona: se uma pessoa está vivendo um trânsito de Júpiter pela quinta casa, isso teoricamente poderia indicar o nascimento de um filho, mas se a daśā em questão não aponta para isso, então Júpiter lhe dará outro fruto de quinta casa (afinal, como disse, todo trânsito traz algum efeito – algo corroborado pelos clássicos de jyotiṣa e pela minha própria experiência prática), ao invés de um filho. Inclusive, se formos parar para pensar, Júpiter influencia a quinta casa por conjunção ou olhar quatro vezes dentro do seu ciclo de doze anos. Ou seja, 1/3 dos trânsitos de Júpiter ao longo de doze anos poderiam indicar o nascimento de filhos – isso para não falar de outros trânsitos dele que também poderiam indicar isso -, mas mesmo assim não vemos as pessoas tendo filhos em todos esses anos seja do segundo, terceiro ou quarto ciclo de Júpiter. Mas por que isso se dá? Porque a daśā também precisa indicar o evento. Se a daśā operante durante um desses trânsitos de Júpiter potencialmente favoráveis para filhos não tiver relação alguma com o tema, então não nascerá filho algum.

Nós também podemos pensar no inverso, ou seja, nas daśās sem os trânsitos, o que também prejudica a precisão da predição. Vamos imaginar um caso onde ao menos cinco grahas tem relação com o tema filhos, seja por ocupação da cinco, regência, olhar à ela ou por relação com o seu regente ou kāraka (significador – Júpiter). Como vamos decidir qual desses grahas vai dar filho(s) em sua(s) daśā(s)? Para isso nós precisamos dos trânsitos! Se uma daśā de um desses grahas for operante no mesmo momento em que há uma ativação relevante do tema filhos por trânsitos, então podemos imaginar o nascimento de um filho nesse período, o que podemos então confirmar pelo uso de várias outras técnicas – outras daśās que não a viṁśottarī, pelo uso do varśaphala (revolução solar), varśācārya etc.

Com essa explicação, creio que qualquer um pode compreender como daśās e trânsitos são interdependentes, e isso não é uma opinião minha, pois ela já foi há muito citada por Varāhamihira, Parāśara, Mantreśvara e outros autores clássicos. Portanto, quando for observar os seus trânsitos, saiba que sem as daśās você não vai conseguir obter uma perspectiva muito precisa do que virá a ocorrer, assim como se for olhar as daśās sem dar atenção aos trânsitos, o resultado será o mesmo: uma percepção incompleta e possivelmente imprecisa. Por essas e outras é que, embora seja muito bom conseguir acompanhar por conta própria os seus trânsitos e daśās, você deve recorrer a um astrólogo se realmente deseja entender como harmonizar adequadamente as indicações desses dois recursos para prever eventos da maneira correta.

Existem outras coisas importantes que eu poderia citar a respeito das dos trânsitos, mas por hoje é só. Em breve, no dia 3 de julho às 19h, farei uma live no instagram onde abordarei mais extensivamente o assunto.

 

oṁ tat sat