Inclusive, é notável que
em textos como Bṛhat jātaka, Sārāvalī, Phaladīpikā e Jātaka pārījāta,
ou não encontramos citações aos upāyas ou se encontramos são, em geral,
citações nada específicas, como: “realize japa, doação e austeridades”.
Mas afinal, “para quem?” Isso não é respondido. O único texto que realmente
foca em práticas específicas é o BPHS. Nele, Parāśara cita práticas que
giram em torno principalmente da adoração à Śiva, Viṣṇu, Durgā e Sūrya, o que é
bastante curioso, pois nos remete ao pañcopāsana (a adoração quíntupla),
onde se adoram essas quatro divindades e Ganeṣa. O pañcopāsana visa
integrar à adoração à cinco divindades centrais nas tradições mais proeminentes
da Índia: śaivas, vaiṣṇavas, śaktas, sauras e ganapatas.
Porém, o pañcopāsana é uma perspectiva de adoração, não é a única e
indisputável, muito menos aceita por todos. O BPHS, certamente foi
compilado por alguém (Parāśara ou sabe-se lá quem) inclinado ao pañcopāsana.
Mas em outros textos não encontramos a presença dessa perspectiva, que se
tornou praticamente a perspectiva padrão em relação à recomendação de upāyas,
como se alguém que não seguisse essa perspectiva estivesse fadado a sofrer com
os efeitos dos grahas. Ou seja, você TEM que adorar Śiva em um período
de Júpiter debilitado, assim como TEM que adorar Sūrya em um período do Sol em
um dusthāna e aflito por maléficos. Mas afinal, será que tem mesmo? A
resposta é simples: NÃO.
Upāyas partem de uma perspectiva religiosa, falam sobre como nós lidamos com o karma a partir da nossa relação com a Divindade. Para alguns, recorrer ao pañcopāsana pode ser natural e saudável, mas para outros, simplesmente orar Ave Maria soa mais confortável e apropriado. Não há dogmas em relação a isso. A recomendação de upāyas deve sempre levar em consideração o contexto cultural, histórico e específico de uma dada pessoa. Não adianta tentar empurrar goela abaixo uma prática hindu para alguém que nem sequer entende dessa tradição, não tem afinidade com ela e vem de uma formação religiosa distinta. Um astrólogo versado nos śāstras pode notar com clareza que, como disse, exceto Parāśara, praticamente nenhum outro astrólogo foi específico quanto a que upāyas aplicar em quais períodos e para quais grahas. Pior ainda: o BPHS que temos hoje nem é o original, o que dificulta sabermos se essas práticas estavam mesmo citadas no BPHS original, embora eu creia que estavam, pois na época em que o BPHS foi composto a síntese dessas cinco tradições - que deu lugar ao pañcopāsana - estava em ascensão na Índia medieval. Mas isso não dá a essa perspectiva autoridade absoluta. Você não precisa seguir os upāyas de Parāśara, pode seguir as práticas religiosas da sua tradição, isso é suficiente para viver uma vida mais integrada e harmoniosa.
K. N. Rao cita em seu
livro “Yogis, destiny and the wheel of time” que em um de seus encontros com um
bābājī proeminente de Vṛndāvana, ouviu dele que quando aderimos à
prática espiritual genuína (ou seja, não se prendendo a nenhum secto
específico), os grahas naturalmente deixam de ser pratikula
(desfavoráveis) e se tornam anukula (favoráveis). O próprio Rao chega a
citar em seus livros que ao longo da sua experiência, observação e estudo, ele
concluiu que uma prática espiritual realizada com fé é o melhor upāya,
não importa qual seja a prática. Inclusive, ele testemunhou sādhus que
recomendavam apenas a recitação do Hanuman chalisa, ou do Śrī Śrī Rādhā-kṛpa-kaṭākṣa-stava-rāja
etc. Dessa forma, os upāyas não precisam seguir os modelos arquetípicos
de cada graha, ou seja, não preciso adorar uma divindade solar para apaziguar
Sūrya, ou uma lunar para apaziguar Candra, basta ter uma prática espiritual
sincera, pois isso nos integra melhor com os mais diversos aspectos da nossa
consciência. Ter uma prática resoluta é como regar a raíz de uma árvore, automaticamente
isso nutre a todos os galhos dela, não é preciso se preocupar com cada galho em
separado. Se Deus é Absoluto, Ele pode abarcar qualquer necessidade, não há
carências nEle. Em outras palavras, a forma da adoração é muito menos
importante do que a substância – a fé que se deposita nela.
Meu conselho, portanto, a todos os que desejam praticar um upāya (outro nome para sādhana) é que simplesmente busquem uma prática que lhes seja coerente e reflita a sua perspectiva espiritual. Não só, busque uma prática que esteja embasada em uma tradição sólida (e não na opinião especulativa de um astrólogo), que possa lhe oferecer todo o suporte em termos de conhecimento, exemplo e inspiração, pois sozinho ninguém é capaz de conduzir uma prática espiritual com sucesso. A prática independente e irresoluta de mantras e outros sādhanas só pode conferir os frutos temporários e insatisfatórios de dharma (religiosidade mundana), artha (progresso econômico) e kāma (satisfação dos desejos materiais), pois é incapaz de aliviar os nossos sofrimentos. Trata-se apenas de uma prática enganosa e dispersiva, visto que o verdadeiro upāya é aquele que coloca a sua consciência acima das dualidades deste mundo, ou seja, te desprende do desejo ilusório de controle sobre o destino, trazendo assim o que é chamado de samātvan - equanimidade -, o fruto da percepção de que o Absoluto é quem está por traz de todos os eventos, agradáveis e desagradáveis. Porém, só ganha essa percepção quem cultiva ao longo da vida um foco espiritual claro, e não quem fica pulando de uma prática a outra tentando resolver os problemas periféricos da vida, oriundos justamente da falta dessa percepção maior. Não à toa, Kṛṣṇa se refere a essas pessoas na BG como hṛta-jña, desprovidas de inteligência, visto que ao invés de cuidarem da raiz dos seus problemas, elas se perdem na periferia desses, o que só os faz multiplicarem.
oṁ tat sat
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