Vênus é um planeta
interior, assim como Mercúrio, pois ambos estão entre o Sol e a Terra. Devido a
isso, esses dois planetas jamais ficam muito distantes do Sol do ponto de vista
terrestre. Vênus por exemplo não dista mais do que 47º30’ do luminar, o que faz
com que o planeta seja visível no céu antes do nascer do Sol (estrela d’Alva)
ou depois do mesmo se pôr (Vésper). Devido ao seu brilho, que do ponto de vista
terrestre só é inferior ao do Sol e da Lua, muitos povos antigos se atentaram
ao planeta, fascinados por sua beleza. Os sumérios por exemplo chamavam Vênus
de Inanna e registraram seu ciclo através de um elaborado mito. Os antigos
egípcios a chamavam por dois nomes, Tioumoutiri e Ouaiti, sendo cada um desses
relacionado ao seu papel enquanto estrela da manhã e do anoitecer, o que fez
com que os egípcios pensassem se tratar de dois corpos diferentes. Os gregos
antigos também se confundiram a esse respeito, tratando Vênus como dois
planetas, Phosphoros (o que traz a luz) durante a manhã e Hésperos (estrela da
noite) durante a noite. Porém, posteriormente compreenderam que Phosphoros e
Hésperos se tratavam do mesmo planeta, a quem passaram a chamar então de
Afrodite.
Na América Latina os Maias tomaram nota minuciosa do
ciclo venusiano integrando-o ao seu calendário religioso. Eles relacionavam
Vênus enquanto estrela da manhã ao deus Quetzalcoatl e como estrela da noite a
Xolotl. Similarmente, no folclore lituano Vênus era chamada de Ausrine (estrela
da manhã) e Akarine (estrela da noite) em suas duas fases onde Ausrine era
encarregada de trazer água, fogo e sopa para satisfazer o Sol e a Lua, enquanto
que Akarine preparava a cama para que pudessem se deitar. Dessa forma, sob
muitos nomes e mitos Vênus encontra-se presente em diferentes culturas ao redor
do mundo.
Na Índia, Vênus é reconhecida na verdade como um deus e
seu nome é Śukra (claro, brilhante ou puro). Tratado como um brāhmaṇa
(sábio) e o guru dos asuras (demônios), Śukra está relacionado ao
caminho da sensualidade (kāma) o qual enreda o ser, cegando-o à
realidade da alma – fator esse que explica porque o Sol enquanto significador
da alma (ātmākāraka) se debilita no signo de libra que é regido por
Vênus. No entanto, é importante salientar que Vênus é também o planeta relacionado ao amor, a beleza e a harmonia, as mais elevadas aspirações humanas.
Phosphoros e Héspheros
Como dito anteriormente, os gregos
antigos chamavam Vênus de Phosphoros e Héspheros em suas fases como estrela da
manhã (d’Alva) e da noite (Vésper), respectivamente. No Jyotiṣa nenhum termo
específico foi dado a essas duas fases e, portanto, vou me valer dos termos gregos nesse
artigo. A distinção entre esses dois períodos de Vênus se dá devido ao movimento do planeta em relação
ao Sol do ponto de vista terrestre. Inicialmente, durante o seu movimento de
retrogradação, o qual perdura 40 dias, Vênus forma uma conjunção interior com o
Sol, isso é, uma conjunção que ocorre no intervalo entre o Sol e a Terra, onde
o planeta fica mais próximo de nós. Nessa fase, que é o ponto de partida de
todo o ciclo, Vênus distancia-se dia após dia do Sol até poder ser vista no
horizonte leste algum tempo antes do amanhecer. Essa é a sua fase enquanto
Phosphoros. 216 dias após a conjunção interior, Vênus forma uma conjunção
externa com o Sol, o que significa dizer que agora Vênus está o mais distante
possível da Terra. Nessa fase ela era chamada Héspheros, a estrela da noite,
pois é visível no ocaso (poente) alguns dias após a conjunção externa.
A
totalidade do ciclo venusiano dura 584 dias (cerca de 19 meses),
assemelhando-se ao ciclo lunar em sua divisão por fases – o que na verdade pode
ser aplicado a qualquer planeta. A conjunção interna de Vênus (momento em que
fica mais próxima da Terra) é análoga a lunação da fase nova (amāvāsya), enquanto sua
conjunção externa (distância máxima em relação a Terra) é análoga a lunação da
fase cheia (pūrṇimā). Portanto, da conjunção interior à conjunção exterior
temos a sua fase como Phosphoros, e da conjunção exterior à interior, sua fase
como Héspheros.
No
mapa astrológico a forma mais simples de se identificar se Vênus está em sua
fase como Phosphoros ou Héspheros é notar sua posição em relação ao Sol. Se
Vênus estiver oriental em relação ao mesmo, ou seja, em graus (ou signos) anteriores
ao do Sol, essa é a fase Phosphoros e o contrário (Vênus em graus superiores)
indica a fase Héspheros. Por exemplo, se o Sol ocupa 6º de aquário e Vênus 20º
de capricórnio (signo e grau anterior), essa é a fase Phosphoros e caso o Sol
ocupe 20º de capricórnio enquanto Vênus ocupa 6º de aquário (signo e grau
posterior), então essa é a fase Héspheros.
Segue abaixo a interpretação para essas duas fases:
Phosphoros:
os nascidos com Vênus oriental em relação ao
Sol são emocionalmente mais expressivos, espontâneos e animados. Perseguem seus
ideais de forma romântica e valorizam novas e prazerosas experiências, embora geralmente se mantenham dentro dos limites de sua cultura, exceto quando Vênus encontra-se em sua fase de retrogradação. Em
termos afetivos os indivíduos da fase Phosphoros recuperam-se com mais facilidade de decepções e são mais abertos
aos relacionamentos. Kalyāna diz o seguinte quanto aos nascidos durante essa
fase: “...será valoroso, famoso, dotado de virtudes e renomado[1]”.
Visto que aquele que nasce durante esse período é mais orientado para si mesmo,
prezando por sua satisfação pessoal, é natural que seja bem-sucedido. Caso
Vênus esteja bem colocada no mapa por signo e casa, formando bons yogas,
então o indivíduo gozará de muitos prazeres ao longo da vida.
Héspheros:
a
Vênus ocidental em relação ao Sol indica uma natureza mais reservada, tímida, emocionalmente
madura e responsável. Devido a sua reserva, podem parecer pouco afetuosos,
embora na realidade apenas interiorizem mais suas emoções. No Sārāvalī
de Kalyāna o seguinte é dito quanto aos nascidos durante esse período: “...será
tímido, se defrontará com obstáculos em suas tarefas, será derrotado e
caminhará suavemente[2]”.
Fica claro nessa menção de Kalyāna que o mesmo era consciente das distinções
entre uma Vênus oriental e ocidental, pois aqui ele caracteriza resultados bastante distintos daqueles que atribui a fase Phosphoros de Vênus. Os indivíduos que
nascem com uma Vênus Héspheros são compromissados com ideais sociais e possuem
um senso de coletividade mais acurado, prezando trazer algum bem-estar a
sociedade, o que costuma faze-los menos preocupados com seu desenvolvimento material e prazer pessoal. São
do tipo que se adequa melhor a sistemas e tradições, sendo bastante comum terem
uma moralidade mais desenvolvida. Devido a isso é comum encontrarmos Vênus na
fase Héspheros no mapa de benfeitores e reformadores sociais, assim como de figuras
religiosas, pois são capazes de renunciar sua satisfação pessoal para abraçar causas
maiores. Também encontram mais dificuldade de se recuperar de decepções
afetivas e, portanto, caso Vênus esteja aflita por maléficos durante essa fase,
o indivíduo será abatido pela melancolia, o ressentimento e a derrota, perdendo assim sua inspiração. Quanto mais próximo Vênus estiver de formar uma conjunção interior com o Sol (antecedida pela retrogradação), maior será a capacidade de introversão, a maturidade emocional e a consciência social do indivíduo.
Essas
duas fases de Vênus também podem ser divididas em várias outras fases menores, como
suas fases de elongação e brilho máximos, conjunção ao Sol ou o seu período de
retrogradação que se dá tanto na fase Phosphoros quanto Héspheros. Como o
artigo visa ser breve, não detalharei aqui sobre essas diferentes fases. Porém, se desejam estudar esses detalhes podem consultar o artigo chamado Venus morning star & evening star Venus do astrólogo humanista, Michal R. Meyer, que me foi de grande serventia para compreender melhor essas distinções do ciclo venusiano.
Hare
Kṛṣṇa
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