Em
um artigo recente, escrevi a respeito dos padas
(ārūḍhas), em especial, pada e upapada lagna, os quais são estudados na astrologia Jaimini. Hoje
venho falar sobre outro tema importante dentro desse sistema de astrologia: os chara kārakas ou significadores
móveis, determinados a partir da ordem de longitude dos grahas. Para os que nunca travaram contato com o conceito,
basicamente envolve notar a ordem decrescente de longitude dos grahas e ir atribuindo títulos
correspondentes a cada um deles. No caso, o graha
com maior longitude em um signo obtém o título de ātmakāraka (também chamado de kāraka
ou svakāraka), enquanto os demais grahas vão obtendo os títulos de amatya (ministro), bhṛatṛ (irmão), matṛ
(mãe), pūtra (filho), jñati (parentes) e por fim darakāraka (esposa), conforme a ordem
decrescente de suas longitudes.
Jaimini
abordou esse conceito em 1.1 de seu Upadeśa sūtra, mencionando um sistema de
sete e outro de oito chara kārakas. Porém,
como vim a aprender com o Shanmukha Teli, Jaimini apresenta as duas visões, mas
não endossa a segunda, ele apenas a menciona como uma teoria da época, ou seja,
que integra Rāhu como o graha a obter
o oitavo kāraka. Essa é, inclusive, a
opinião do grande nome de Jaimini Jyotiṣa, Śrī Vemuri, assim como também de K.
N. Rao.
Por muito tempo eu fiquei confuso com a questão dos chara kārakas, sem saber se deveria usar sete kārakas sempre ou oito em certas circunstâncias (nunca me passou pela cabeça usar sempre oito, a não ser bem no início de meus estudos, quando nem sequer sabia direito sobre essas divergências). A explicação do Shanmukha me ajudou a dissipar essa dúvida, porém, foi quando tive contato com o Kalpalatha de Somanātha que pude entender melhor o porquê dessa grande confusão em relação ao tema. Somanātha, um dos comentadores mais antigos do Upadeśa sūtra de Jaimini, menciona que há duas escolas em relação aos kārakas, sendo que uma é baseada em Varāhamihira e toma apenas os sete grahas visíveis como referência[1], enquanto outra, menos popular, toma Rāhu como uma oitava referência, excluindo Ketu. Ele é bem claro, no entanto, em dizer que a escola de Varāhamihira sempre foi a mais popular, algo que está de acordo com o que Shanmukha havia me dito antes, de que Jaimini não endossava a segunda visão.
Além
desse testemunho, que foi bastante importante para eu optar por usar sete kārakas sempre e não mais sete ou oito a
depender da circunstância, o fato desse sistema de chara kārakas se alinhar perfeitamente com os temas das sete
primeiras casas foi indispensável. No caso, a relação fica da seguinte forma:
Casa
1 - Ātmakāraka (indivíduo)
Casa
2 - Amatyakāraka (ministros, conselheiros)
Casa
3 - Bhṛatṛkāraka (irmãos)
Casa
4 - Matṛkāraka (mãe)
Casa
5 - Pūtrakāraka (filhos)
Casa
6 - Jñatikāraka (parentes)
Casa
7 - Darākāraka (esposa)
Vejam
que o tema de cada kāraka se alinha com os temas das casas, inclusive, mesmo o jñatikāraka tem relação com a seis, pois essa é a casa dos tios e
tias maternas. K. N. Rao ainda faz a observação de que o jñatikāraka seria um significador de inimigos e doenças, sendo que
ele já mostrou com vários exemplos como os períodos da chara daśā que sofrem influência do jñatikāraka se mostram problemáticos em termos de saúde e
dificuldades com inimigos.
Agora,
notem como fica o arranjo quando usamos oito kārakas:
Casa
1 - Ātmakāraka (indivíduo)
Casa
2 - Amatyakāraka (ministros, conselheiros)
Casa
3 - Bhṛatṛkāraka (irmãos)
Casa
4 - Matṛkāraka (mãe)
Casa
5 - Pitṛakāraka (pai)
Casa
6 - Pūtrakāraka (filhos)
Casa
7 - Jñatikāraka (parentes)
Casa
8 - Darākāraka (esposa)
Aqui,
há um desalinho dos temas dos kārakas
com as casas, que tem início no quinto kāraka
e se estende até o oitavo, o que é desarmonioso. Alguns astrólogos, inclusive,
opinam que esse sistema de oito kārakas
deveria ser aplicado apenas quando dois grahas
disputam um mesmo título, em virtude de ocuparem o mesmo grau, ainda que em
signos diferentes. Por algum tempo eu acreditei nessa teoria, que inclusive é
apresentada na versão moderna e interpolada do BPHS, mas tanto Shanmukha quanto
o K. N. Rao tem um bom argumento em relação a isso: simplesmente notar quem
detém uma posição superior em termos de minutos. Por exemplo, se dois grahas estão situados a 26º de libra,
mas um ocupa 26º50' enquanto o outro ocupa 26º53', fica evidente que o segundo
é que tomará o título em questão, enquanto o graha seguinte ficará com o título posterior.
Shanmukha
até chegou a me dizer que a inclusão de um oitavo significador em casos de disputa possivelmente era um improviso que os astrólogos
da época desenvolveram para lidar com possíveis imprecisões de cálculo, onde a
determinação dos minutos poderia ser mais problemática, o que não deixa de ser verdade. Mesmo
que os astrólogos do passado fossem muito hábeis em seus cálculos, é notável
que os horóscopos antigos que foram preservados até os dias atuais contém não
só minutos como também graus incorretos em muitos casos.
Agora que o tema já foi introduzido juntamente de todas as suas controvérsias, cabe a
cada um refletir a respeito e decidir qual sistema de chara kārakas usar, o de sete, o de oito ou o que usa oito apenas
em circunstâncias onde dois ou mais grahas
ocupam um mesmo grau. Enquanto refletem sobre isso, vou me preparando para escrever um próximo artigo sobre o ātmakāraka, o significador da alma, o mais importante de todos os chara kārakas.
oṁ tat sat
[1] Varāhamihira antecede Jaimini e
não ensinou chara kārakas, no
entanto, ele focava nos sete grahas
visíveis, como fica evidente em seu Bṛhat jātaka.
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