Na Índia, Júpiter é
chamado de Guru, que superficialmente significa "professor". O seu
significado mais profundo, no entanto, é expresso na Advayatārakopaniṣad,
que diz:
गुरुभक्तिसमायुक्तः पुरुष्ज्ञो विशेषतः।
gurubhaktisamāyuktaḥ
puruṣjño viśeṣataḥ |
एवं लक्षणसंपन्नो गुरुरित्यभिधीयते॥ १५॥
evaṁ lakṣaṇasaṁpanno
gururityabhidhīyate || 15||
A
sílaba "gu" significa escuridão e "ru", aquele que
dispersa. Portanto, quem tem tal poder de dispersar a escuridão da ignorância é
um guru.
Logo, alguém capaz de
guiar um indivíduo da treva de tamas
(inércia, escuridão, ignorância) a luminosidade de sattva (bondade, equilíbrio, conhecimento) pode ser chamado de guru. No entanto, guru também pode se referir a alguém que remove nossas dúvidas
quanto a um determinado ramo de conhecimento, não necessariamente espiritual.
Outra tradução da
palavra guru é "pesado",
referindo-se ao fato de um guru deter
vasto conhecimento e estar firmemente alicerçado na verdade absoluta, ou seja, ele
é um tattva-darśī (um vidente da
verdade). De um ponto de vista mundano, qualquer pessoa que tenha vasta
experiência e conhecimento em um determinado tema também pode ser considerado
um guru, ou seja, um mestre.
Astrologicamente,
Júpiter é quem personifica todas essas características. Inclusive, ele é o
único graha exclusivamente kapha, ou
seja, que partilha das características desse doṣa como ser pesado, macio, untuoso, doce e estático, o que
favorece a sua natureza benevolente, tolerante e pacífica, uma vez que kapha é um doṣa mais associado as características femininas, pois combina dois
elementos femininos em si: a água e a terra.
Jaimini, em seu Upadeśa sūtra, diz que Guru no lagna (seja do mapa natal, svāṁśa[1]
ou āruḍha lagna) faz o indivíduo
devotado a atividades que envolvam o conhecimento (karmajñānaniṣṭhā), além
de denotar um conhecedor do veda (vedavidaḥ). Ocupando a um, dois, três ou
cinco junto a Chandra (Lua), Guru indicará um autor (granthakrīt), enquanto sozinho indicará um erudito (sarvavīd), alguém cuja compreensão é
profunda (grānthīkaḥ), que não é tão
bom orador, mas que se distingue pelo seu conhecimento de gramática (vaiyākaranaḥ), assim como dos vedas e vedāngas (vedavedāngavit). Guru relacionado a Ketu em um, dois, três ou
cinco, denota alguém que realizou o conteúdo de uma doutrina estabelecida por
uma tradição (sampradāyika siddhaḥ),
na doze, alguém dedicado a caridade e atos benevolentes, etc.
Mantreśvara, em sua
Phaladīpikā, pontua algo muito importante quanto a Guru ao dizer que ele é o
mais poderoso dentre os grahas no que
tange mitigar males e, portanto, sua influência sobre um determinado graha ou casa problemática indica que
conselhos, esperança, remédios, disciplinas espirituais (mantras, pūjas, vratas, etc.) e outras coisas benéficas
estarão ao seu alcance, o que lhe auxiliará em relação a tais males.
Também podemos pensar
no seguinte: Guru é o kāraka de
quatro casas: dois, cinco, nove e onze, todas casas relacionadas a dhana (fortuna), sendo que a casa dois
também trata do discurso (vak), a
cinco de filhos, conhecimento e sādhana (disciplinas
espirituais) e a nove de dharma
(religiosidade), gurus, austeridades
e peregrinações. Dessa forma, todo tipo de fortuna e auspício está sob o seu
comando e, onde quer que Guru esteja e o que quer que influencie com seus
olhares de casa cinco, sete e nove, será nutrido e beneficiado por tais
recursos.
Sendo o regente do akāśa-tattva, o elemento éter/espaço,
Guru também é responsável por harmonizar e oferecer o espaço necessário para
que cada coisa seja acomodada apropriadamente.
Isso também nos leva a compreender que Guru aumenta a capacidade do que
influencia de acomodar mais coisas em si, expandindo as possibilidades dos
pontos influenciados, dando-lhes maior liberdade, ou seja, um efeito que é oposto
ao de Śani (Saturno), que restringe as possibilidades do que afeta.
Para melhor
exemplificar tudo isso, apresento abaixo alguns mapas onde Guru se destaca de
alguma forma:
Abū
Ma'Shar
Guru debilitado, mas
retrógrado na dez e com o seu dispositor digno na onze fizeram de Abu Ma'Shar
um astrólogo destacado. O fato de ocupar a décima casa fez com que o mesmo
fosse o conselheiro de pessoas nobres ou que detinham status, além de tê-lo
tornado um líder dentre os astrólogos de sua época, lembrado até hoje por seus
feitos e contribuições. Visto que Guru está debilitado, mas retrógrado, Abū
Ma'Shar inicialmente era cético quanto a astrologia e foi somente com 47 anos
de idade que começou a se dedicar a esse campo.
A partir do ārūḍha,
Guru ocupa a dois, confirmando que seria um erudito, versado em gramática assim
como em textos sagrados - ele era muçulmano. Da dez, Guru olha a dois, a quatro
e a seis, sendo que o seu olhar a dois em particular nos diz muito, uma vez que
essa é a casa da oratória, contribuindo com a sua capacidade de predição,
ensino e aconselhamento. O olhar a seis ajudou a protegê-lo de perseguições
religiosas, uma vez que era reconhecido como membro da terceira geração de uma
elite intelectual persa notável.
Albert
Einstein
No mapa de Albert
Einstein, Guru ocupa a nove e forma um dharma
karmādhipati yoga com Śani (Saturno), uma vez que trocam signos (parivartana yoga). Esse yoga fez de Albert Einstein destacado e
uma grande referência por seus feitos no campo científico, especialmente porque
Guru ainda ocupa o svāṁśa, aquário,
denotando alguém que se dedicaria a atividades relacionadas ao conhecimento e
que incorporaria o papel de um guru
dentre os cientistas, visto que Śukra (Vênus) detém grande força no seu mapa,
denotando uma abordagem mais científica.
Da nove, Guru olha a
cinco, enquanto o regente da mesma está exaltado na décima casa, o que lhe
conferiu filhos e inteligência, ainda mais porque Guru também influencia o lagna e a terceira casa, outras duas
casas importantes no que tange a inteligência.
Śrī
Chandrasekharendra Sarasvatī
No mapa de
Chandrasekharendra Sarasvatī, um dos āchāryas
da linhagem de Śankarāchārya, Guru reside na décima casa, junto a uma conjunção
exata entre Budha (Mercúrio) e Sūrya (Sol), o que fala sobre o seu poder de
liderança em relação a sua linhagem. No navāṁsa,
Guru ocupa a dez do ātmakāraka Śani (Saturno), e está junto a Ketu, o que fala
sobre Chandrasekharendra, enquanto um representante de uma doutrina
tradicional, a do advaita vedānta.
O fato do lagneśa estar junto a Guru, regente de
cinco e oito, gera um rāja yoga e o
empodera diretamente com as características de um guru. Além disso, o parivartana
existente entre Guru e Śukra trouxeram ao mesmo experiências místicas e
conhecimento acerca dos mistérios do yoga,
os quais o mesmo se dedicou a ensinar ao longo de sua vida, uma vez que Guru
ocupa a casa do karma a partir do lagna e a do dharma a partir do svāṁśa
(virgem).
Śani e Ketu em um trikoṇa de Guru contribuíram com a sua
dedicação ao caminho espiritual, enquanto a oposição a Chandra enobreceram e
elevaram a sua mentalidade e emoções. Nesse mapa o gaja kesari é efetivo, uma vez que Chandra, embora debilitado, está
vargottama, em kendra e tanto Guru quanto Chandra são influenciados por um
benéfico: Budha, tornando Chandrasekharendra destacado entre eruditos, nobre,
intenso, longevo (viveu 100 anos) e valoroso.
Jack
Kerouac
Um grande ícone do
movimento beatnik, Jack Kerouac levou uma vida desregrada, baseada em viagens,
drogas, sexo, jazz, mas que também combinava o interesse pelo pensamento
oriental em si.
Em seu mapa, é notável
que Guru esteja retrógrado na dois e conjunto a dois maléficos: Śani (Saturno)
e Rāhu. Ele ainda recebe o olhar de seu grande inimigo, Śukra (Vênus), o qual
está exaltado. Nisso, temos rāja yogas (yogas de sucesso) se formando juntamente
de ariṣṭas (yogas que causam misérias, doenças, etc.), o que explica o fato de
Kerouac ter alcançado o sucesso, enquanto um "vagabundo do dharma",
em referência ao seu próprio livro.
A dois fala sobre a
nossa família, de sangue ou não, além de descrever nosso discurso e hábitos
alimentares. Guru aflito por Śani, Rāhu e sob o olhar do aquoso Śukra falam
sobre o seu alcoolismo, assim como de sua grande família de "vagabundos",
os beatniks.
Uma vez que Guru ocupa
a cinco do svāṁśa (touro), mas aflito, Kerouac não foi capaz de realmente
desenvolver uma compreensão profunda das coisas, uma vez que Śani e Rāhu
distorceram a sua compreensão. Inclusive, há um episódio de sua vida em que
desejando vivenciar a prática budista isolado em uma casa nas montanhas, o
mesmo acaba é se embriagando constantemente. Esses efeitos se devem ao seu guru chandala yoga[2]
na dois sob o olhar de Śukra exaltado, sendo ele o guru dos asuras (seres
ignorantes, ímpios), o qual aqui triunfa sobre Bṛhaspati (Júpiter), o guru dos devas (seres esclarecidos, elevados).
Śrīla
Bhaktisiddhānta Sarasvatī Ṭhākura Prabhupāda
Śrīla Bhaktisiddhānta
Sarasvatī foi o āchārya quem fundou a
gaudiya mātha, a instituição que visa
difundir os ensinamentos de Śrī Chaitanya Mahāprabhu. Em seu mapa, o lagneśa, Chandra está junto a Guru na
três, o qual está śakta (poderoso -
retrógrado), próximo a Ketu e a formar uma série de rāja yogas com Chandra e Maṅgala (Marte), o qual lhe opõem na nove.
Essa configuração fala sobre Śrīla Bhaktisiddhānta enquanto um mahātma ferozmente dedicado a pregação
(casa três) e sempre absorto em estudos profundos sobre temas espirituais, uma
vez que possui um gaja kesari yoga sob
influência do inflamado e enérgico Maṅgala.
O seu svāṁśa é virgem, exatamente onde estão
Chandra e Guru, o que indica um autor de grande excelência, de acordo com
Jaimini. De fato, Śrīla Bhaktisiddhānta escreveu inúmeros livros e artigos ao
longo de sua vida. Ele também era muito versado nos vedas e vedāngas
(incluindo jyotiṣa), sendo temido por
seus opositores, devido a sua vasta erudição e capacidade argumentativa (Maṅgala
olhando o svāṁśa fez dele hábil em nyāya - lógica e argumentação).
Om
tat sat
[1] Signo ocupado pelo ātmakāraka no navāṁśa que é usado como um ascendente tanto no navāṁśa quanto no mapa natal.
[2] Quando Guru está com Rāhu sob a
influência de um maléfico, o indivíduo desvia ou não se adéqua aos princípios
tradicionais, levando um estilo de vida excêntrico e muitas vezes imoral.
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