terça-feira, 23 de maio de 2017

Grandes personalidades e os mahāpuruṣa yogas

Dentre os vários yogas descritos nos textos de jyotiṣa, há um grupo que ganhou grande importância: o dos mahāpuruṣa yogas. A palavra por si só já é bastante significativa, pois se refere a uma grande (mahā) personalidade (purūṣa), alguém cujo destino é singular e que possui no corpo certas marcas (lakṣanas) que a distinguem dos demais.

Em seu Bṛhat Parāśara horā śāstra, o sábio Parāśara define os mahāpuruṣa yogas da seguinte forma (75.1-2):

"...quando Marte, Mercúrio, Júpiter, Vênus e Saturno, ocupando seu domicílio (svakṣetra), mūlatrikoṇa ou signo de exaltação (uccha), estiverem simultaneamente em uma casa angular (kendra; 1-4-7-10) a partir do ascendente (ou da Lua), isso dará origem a ruchaka, bhadra, haṁsa, malavya e ṣaṣa yoga, respectivamente. Esses yogas são chamados de pancha mahāpuruṣa yogas e as pessoas que nascem sob tais yogas tornam-se grandes personalidades".

Mantreśvara, Kalyāna, Vaidyanātha e tantos outros autores importantes também incluíram os pancha mahāpuruṣa yogas em seus textos. Mantreśvara, na Phaladīpikā, abre o capítulo de yogas justamente com os pancha mahāpuruṣa yogas, enquanto Kalyāna dedicou um capítulo inteiro a discutir a força dos elementos, guṇas e dos mahāpuruṣa yogas. Isso nos dá uma idéia da importância desses yogas na tradição do jyotiṣa.

Se analisamos com mais cuidado a formação desses yogas, não é a toa que foram tão enfatizados. Em primeiro lugar, envolvem cada um dos pancha tāra grahas[1] (Marte, Mercúrio, Júpiter, Vênus e Saturno) detendo força e em segundo lugar, eles devem estar dispostos nos kendras, as casas angulares (a partir do ascendente ou da Lua natal), definidas por Parāśara como as mais fortes dentre todas as casas do mapa. Isso por si só já faz de tais posicionamentos louváveis.

Quando um graha se situa em um kendra ele obtém o chamado kendrādi bala, um tipo específico de força que destaca os seus efeitos quando comparado com os efeitos de um graha em casa sucedente (2-5-8-11) ou cadente (3-6-9-12). Há várias evidências de como um graha em casa angular possui uma força destacada e capaz de predominar sobre os outros aspectos do mapa. Por exemplo, quando há certos yogas de morte precoce presentes no mapa, um graha benéfico em kendra detendo força é suficiente para mitigar os males de tais yogas.

No caso dos mahāpuruṣa yogas, eles imprimem na natureza do indivíduo as características do graha que forma o yoga, ou seja, destaca o seu guṇa, elemento e natureza intrínseca, além de exaltar os temas da casa ocupada e daqueles que rege. Todos esses elementos definem a fonte da proeminência do indivíduo. Inclusive, deve-se notar que há claras diferenças entre um mahāpuruṣa formado por Júpiter ou Saturno, assim como há diferenças entre um mahāpuruṣa formado por um mesmo graha, mas em casas diferentes ou mesmo a partir de ascendentes diferentes.

Outro ponto importante é que um mahāpuruṣa yoga tem os seus bhangas, ou seja, os fatores que o nulificam ou minimizam seus efeitos. Alguns desses são a conjunção a um luminar (Sol ou Lua), a aflição por maléficos, pāpa kartari (grahas maléficos no signo seguinte e anterior ao mesmo), a sua fraqueza em outros vargas (divisionais) e balas (classificações de força), assim como a fraqueza dos luminares no mapa[2], os quais são responsáveis por sustentar os yogas de um mapa, especialmente os rāja yogas, dos quais os mahāpuruṣa yogas podem ser considerados como tais.

Segue abaixo um notável exemplo de mahāpuruṣa yoga:

Śrī Tridaṇḍi Svāmī


Śrī Tridaṇḍi Svāmī foi um dos grandes santos da tradição śrī vaiṣṇava de Ramanujāchārya. Em seu mapa há dois mahāpuruṣa yogas formados a partir da Lua natal (o horário de nascimento do mesmo é desconhecido): ruchaka, por Marte e ṣaṣa, por Saturno. No entanto, o ruchaka mahāpuruṣa está em parte impedido pela conjunção a Lua, enquanto o ṣaṣa de Saturno é parcialmente obstruído pela conjunção a Ketu. Porém, visto que os luminares no mapa detém força, tais yogas não deixaram de dar os seus frutos. O Sol no mapa se encontra exaltado, enquanto a Lua, detém luminosidade e forma um nīchabhanga (anulação de debilitação), causado pela conjunção ao seu dispositor, Marte.

Essas configurações garantiram os resultados do mahāpuruṣa yoga, mas de forma distinta, pois esses mahāpuruṣa coexistem com certos pravrajya yogas que são combinações que conduzem a renúncia e ao asceticismo. A Lua em signo de Marte sob influência de Marte e Saturno é um pravrajya, enquanto a conjunção de quatro grahas no signo de áries e a conjunção de Saturno a Ketu são outras combinações que o conduziram a árduas disciplinas espirituais.

Tridaṇḍi Svāmī viveu 94 anos, sendo que 74 anos de sua vida foram vividos sob o voto de renúncia (sanyāsa). Ao longo desse período ele escreveu inúmeros comentários aos textos sagrados, construiu vários templos, escolas e currais para vacas; além disso, na qualidade de um grande pregador ele instruiu inúmeras pessoas, tornou-se um mestre no aṣṭānga yoga de Nathamuni, manifestou siddhis e experimentou transes meditativos que chegavam a durar cinco, sete e até mesmo quinze dias. Sem dúvida alguma, Tridaṇḍi Svāmī é o exemplo claro de um mahāpuruṣa.

Em relação as observações clássicas, Kalyāna, em sua Sārāvalī, diz que o indivíduo que nasce sob ruchaka yoga deterá grande força, será esplendoroso, de um rosto longo, valoroso, deterá conhecimento de mantras, honrará os devas e os brāhmaṇas, além de deter uma série de sinais auspiciosos no corpo. Inclusive, é notável que Marte dispõem os dois principais pravrajyas de Tridaṇḍi Svāmī: o formado pela conjunção a Lua e o que se dá em áries pela conjunção de quatro grahas. Isso fez com que a fonte de sua proeminência fosse a sua própria entrega espiritual que era profunda e intensa como um Marte tão destacado já pressupõem. Em relação ao ṣaṣa yoga, as características de Saturno proeminentes em um indivíduo com pravrajya yogas presentes em seu mapa contribuem significativamente para uma vida ascética, visto Saturno ser o significador do asceticismo. O fato de Saturno ocupar a quarta da Lua indica que parte do seu reconhecimento viria dos muitos templos que ele ajudaria a fundar e a manter, assim como de seu profundo desapego emocional, típico de um sanyāsī fidedigno.

Om tat sat


[1] Tāra é uma estrela e, como tais grahas se assemelham a estrelas do ponto de vista da Terra, são chamados de tāra grahas, o que difere do Sol e da Lua que, devido ao grande disco que possuem são chamados de mandala grahas.
[2] 38.28, Sārāvalī de Kalyāna Varma

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