quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Signos inteiros, casas iguais ou quadrantes? O que adotar?

Os primeiros livros de astrologia de que temos notícia não diferenciam signos de casas. Seja na tradição helenística ou indiana, a ideia é a mesma: uma vez determinado o signo ascendente, o segundo signo tratará dos temas de dois, o terceiro dos temas de três, e assim por diante. Não importa se o ascendente está a 29º de um signo, todo o signo representará os temas do ascendente, enquanto a mesma ideia se aplica aos demais signos.

Esse sistema, denominado “signos inteiros” ou whole-sign houses (WSH) era o padrão vigente até o século IX. Não que os astrólogos do passado não sabiam ou não usavam os sistemas de casas iguais (bhāva-chakra) ou de quadrantes (bhāva-chalita), na verdade eles já tinham conhecimento desses sistemas, mas não parece que nessa época os tópicos eram atribuídos as casas calculadas matematicamente com base nas divisões terrestres. Os tópicos pertenciam aos signos, ao passo que os sistemas de casas, especialmente o de casas iguais, mostraria o quão eficiente um graha seria em manifestar os temas indicados pelo signo que ele ocupava, conforme sua distância da cúspide da casa. Além disso, há exemplos de alguns usos bem específicos dos sistemas de quadrantes na tradição helenística, o que limitaria sua aplicação apenas para contextos bem definidos, ou seja, eles não seriam usados para determinar tópicos.

Um exemplo pode tornar as coisas mais claras: suponhamos que alguém possua Maṅgala (Marte) em leão e o seu signo ascendente seja virgem. No caso, Maṅgala ocupa o décimo-segundo signo a partir de virgem, o ascendente, logo ele trata dos temas de doze. Mas se em um sistema de casas como o bhāva-chakra ou o bhāva-chalita esse Maṅgala desliza para a casa seguinte ou anterior, ele continuará a falar sobre os temas de doze, mas com uma capacidade de impacto sobre tais temas já reduzida. Alguns diriam que Maṅgala, nesse caso, falaria sobre ambos os temas, os da décima-segunda e também da outra casa ocupada por quadrante (bhāva-chalita) ou divisões iguais (bhāva-chakra). Mas, eu particularmente cheguei à conclusão de que, embora isso tenha sua lógica, acaba que torna as coisas mais complicadas e, por sinal, não sou só eu quem pensa isso, muitos outros astrólogos, dedicados ao jyotiṣa ou mesmo a astrologia helenística, em particular, optam por usar signos inteiros para determinar os tópicos a que um graha se refere.

Até pouco tempo atrás eu usava o bhāva-chakra para determinar os tópicos, mas depois de seguir observando e estudando mais a fundo o tema, não só na tradição indiana como também na tradição helenística, cheguei à conclusão de que signos inteiros é a melhor opção para determinar tópicos, enquanto os sistemas de casas podem ser usados para determinar o quão eficiente um graha é para manifestar os temas da casa em questão. Nesse caso, eu prefiro o bhāva-chakra, uma vez que o bhāva-chalita pode criar distorções absurdas nos tamanhos das casas. 

Essa abordagem fornece uma solução intermediária para um problema onde geralmente as opções são extremas. Uns dizem que se deve usar apenas signos inteiros, enquanto outros usam apenas sistemas de casas para definir tópicos - ambas abordagens que eu mesmo já segui -, mas a verdade é que há algo de verdadeiro em cada opção. Inclusive, não acho que uma mudança na posição de um graha dentro do bhāva-chakra seja inútil ou incapaz de representar um tópico, pois essa mesma foi a minha abordagem ao longo dos últimos anos, mas noto hoje que alienar por completo o uso do rāśi-chakra não é a melhor opção, pois uma vez que um graha ocupa um signo, quer ele esteja dentro da divisão terrestre da casa ou não, ele tem relação com o signo, o qual por sua vez tem relação com um tópico. Nesse sentido, vejo hoje que o signo acaba sendo até mais relevante do que a divisão de casas para determinar um tópico.

Quando estudamos a história desses diferentes sistemas (signos inteiros, casas iguais e quadrantes), é notável que no período medieval, entre os persas e árabes, os astrólogos progressivamente foram passando a ignorar a doutrina dos signos inteiros - o padrão no período helenístico - para então usar dos sistemas de casas para definir tópicos, o que então passou a ser a visão padrão no ocidente até os dias atuais. Essa mudança de perspectiva certamente tem muito a ver com os avanços científicos que se deram durante o período de ouro do império islâmico, o que tornou a astrologia mais técnica e matemática, e menos simbólica e representativa. Além disso, a tradução incorreta por parte dos persas e árabes de passagens de textos gregos antigos, como o Carmen astrologicum/Pentateuch de Dorotheus, também abriram brechas para dúvidas a respeito do que definiria tópicos: signos ou casas? E embora isso se refira particularmente a tradição ocidental de astrologia, a Índia não saiu isenta, pois vemos indícios do uso dos sistemas de casas para definir tópicos em alguns textos clássicos indianos do período medieval, como o Jātaka karma paddhati (o mais matemático e técnico de todos), Phaladīpikā, Jātaka pārījāta e outros. Afinal, indianos e árabes interagiram extensivamente durante o período medieval, que foi justamente a época em que o tājika se desenvolveu na Índia, sendo esse um sistema com claras influências perso-árabes, a começar pelo próprio termo “tājika”, cujo significado é justamente “árabe” ou “persa”.

Ainda assim, o sistema de signos inteiros conseguiu se preservar muito melhor na Índia do que na tradição ocidental. A maior parte dos astrólogos indianos, inclusive, usa apenas signos inteiros, mas há também aqueles que usam ou usaram de sistemas de casas, como é o caso de B. V. Raman e Suresh Chandra Mishra, por exemplo, entre os mais recentes. Logo, acho válido que um astrólogo observe tanto a posição de um graha por signo inteiro, como também por sistema de casas, sendo que dou preferência ao bhāva-chakra (casas iguais), porém, minha recomendação, que é também a recomendação de muitos astrólogos indianos e mesmo de eruditos na tradição ocidental (helenística e medieval), como Robert Schmidt, Benjamin Dykes e Chris Brennan, é de que os tópicos sejam principalmente relacionados aos signos inteiros. As casas terrestres podem ser utilizadas para determinar o grau de eficácia do graha em manifestar seus tópicos, e também para significar de forma mais secundaria e menos enfática um determinado tópico - algo inclusive exemplificado em uma passagem de Vettius Valens, autor do período helenístico -, uma vez que é preciso tomar uma posição em relação ao que os determinaria primariamente. Essa me parece ser uma opção intermediária das mais inteligentes para lidar com esse problema que é e sempre será complexo, pois quando falamos de astrologia, estamos falando principalmente de representação, ou seja, não estamos tratando de exatas, o que já impede definições absolutas.

oṁ tat sat

3 comentários:

  1. Olá. Tomando como base o programa do Jagannatha HORA, o correto seria ajustar as casas selecionando a opção " Each rasi is a house " ou " Equal houses 30 dg each"? O ascendente( lagna) também me confunde...o ideal é escolher que ele figure no meio da primeira casa ou no início dela? Grato se puder aclarar. Haribol...Hare Krishna.

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  2. Olá! O correto é "equal house 30 dg each" e "meio da casa". Haribol!

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