quarta-feira, 8 de maio de 2019

A homossexualidade pode ser identificada em um mapa?

Certa vez vi um astrólogo dizendo que não era possível determinar homossexualidade em um horóscopo, mas isso definitivamente não é verdade. Há indicações de homossexualidade sim. No caso, em termos de gênero, Sūrya, Maṅgala e Guru são definidos como grahas masculinos, Śukra e Chandra como femininos, enquanto Budha e Śani são definidos como eunucos (kliba). A designação usada nesse caso, de “eunuco”, sem dúvida pode soar pejorativa, porém a ideia é de que o indivíduo seria indiferente ou impotente em relação ao sexo oposto, ou seja, teria inclinação a homossexualidade.

Com isso em mente, fiz um estudo com dezenas de mapas de homossexuais e repetidamente notei o seguinte:

(1) A sete (do lagna e/ou de Chandra), seu senhor e/ou Śukra aparecem sob influência dos kliba-grahas: Śani e/ou Budha, assim como também podem estar ocupando os rāśis ou navāṁśas regidos por esses.

(2) Significadores pessoais, isso é, o lagna, lagneśa, Chandra e/ou Sūrya aparecem frequentemente ou sob influência de Śani e/ou Budha ou ocupando os rāśis ou navāṁśas regidos por esses. Por vezes ambas as coisas ocorrem.

Há algumas outras configurações menos comuns que também observei, porém essas são as mais frequentes. Na verdade, mais do que isso, elas estão sempre presentes.

Uma pesquisa como essa é interessante porque deixa bastante claro que a homossexualidade, condenada em tradições abraâmicas como o cristianismo, é na verdade parte da natureza e não uma anomalia. Inclusive, na cultura védica/hindu, considera-se que a homossexualidade seja o terceiro sexo (tṛtīya-prakṛti). Por sinal, nem mesmo a medicina aceita que a homossexualidade seja uma doença ou algo que se adquire, pois ela é inata, algo que o āyurveda já dizia a milênios atrás.

Até na natureza já está mais do que provado que praticamente não existem espécies que não apresentem comportamento homossexual. Todos os seres, quer sejam humanos ou animais, apresentam comportamentos homossexuais. Porém, com isso não venho aqui exaltar nenhum gênero ou abraçar a causa LGBT, longe disso, minha intenção é apenas mostrar como até mesmo pelo jyotiṣa é possível entender que a homossexualidade é apenas uma outra variação da sexualidade, que como é mencionado na tradição, trata-se de tṛtīya-prakṛti, o terceiro gênero.

Uma das minhas motivações, inclusive, de escrever este artigo é rebater um pensamento retrógrado que sempre ouvi da parte até mesmo de parentes, todos eles “cristãos” (definitivamente não sou contra o cristianismo em si), de que a homossexualidade era uma anomalia e algo condenado por Deus. Embora seja hetero, nunca vi sentido nessas alegações, pois o que aprendemos na tradição hindu é de que a luxúria é que é, de fato, o verdadeiro problema. Pouco importa o gênero, o problema está na luxúria e na identificação com o corpo em si. Mas, veja bem, se tomamos isso como referência, então podemos dizer que praticamente todos estão condenados, pois afinal, quem é que não sofre com as perturbações da luxúria (especialmente na juventude)? Quem é que não se identifica com o corpo e está livre da absorção na dualidade?

Mesmo um heterossexual que vive uma relação monogâmica, caso não consiga dominar o impulso sexual, ele já está, do ponto de vista do yoga amarrado à mahāmāyā (a grande ilusão) e, portanto, não está apto a atingir a perfeição espiritual, enquanto não se libertar de sua absorção nas amarras do corpo - das quais a luxúria é a principal. Definitivamente, ninguém pode atingir a perfeição espiritual sem sublimar a sexualidade ou usá-la no máximo para o seu propósito natural: a procriação. Isso porque a sublimação sexual é justamente essencial para atingir o despertar espiritual.

Todos os grandes acharyas e gurus do passado e do presente seguiram e seguem estritamente o celibato. Mesmo os que foram ou são chefes de família, valeram-se ou valem-se da sexualidade apenas para ter filhos. Isso sim está de acordo com o dharma e, ainda que não consigamos viver dessa forma, por ainda desejarmos satisfazer nossos próprios sentidos, de forma alguma devemos tentar mudar os ensinamentos para que esses convenham à nossa própria satisfação pessoal. Logo, a menos que o indivíduo tenha completo controle sobre o seu próprio desejo sexual, quer ele seja hetero ou homossexual, definitivamente as portas do paraíso ainda estão fechadas para ele. Ninguém pisa em solo espiritual sem antes ter superado as tentações da carne, mesmo que essas sejam em relação ao sexo oposto. Logo, ser hetero ou homossexual nada tem a ver com a elegibilidade necessária para se atingir a libertação espiritual. O necessário é superar a identificação com o corpo, inclusive com o gênero em si. Até lá, temos de lutar contra os sentidos... daí da necessidade de se executar sādhana (disciplina espiritual).

A evidência para tudo o que disse acima são os seguintes ślokas da Bhagavad gītā (03.36-43):

Arjuna disse: Ó descendente de Vṛṣṇi, o que impele alguém a atos pecaminosos, mesmo contra a sua vontade, como se ele agisse à força?

Bhagavān Śri Kṛṣṇa disse: É somente a luxúria (kāma), Arjuna, que nasce do contato com a qualidade material da paixão (rajas) e mais tarde se transforma em ira (krodha), que é o inimigo pecaminoso que a tudo devora neste mundo.

Assim como a fumaça cobre o fogo, o pó cobre um espelho ou o ventre cobre um embrião, diferentes graus de luxúria cobrem o ser vivo.

Assim, a consciência pura do sábio ser vivo é coberta por seu eterno inimigo sob a forma da luxúria, que nunca é satisfeita e queima como o fogo.

Os sentidos, a mente e a inteligência são os lugares de assento para esta luxúria. Através deles, a luxúria confunde o ser vivo e obscurece o verdadeiro conhecimento que ele possui.

Portanto, ó Arjuna, ó melhor dos Bharatas, desde o início, refreie este grande símbolo de pecado [a luxúria], regulando os sentidos, e aniquile este destruidor do conhecimento e da auto realização.

Os sentidos funcionais são superiores à matéria bruta; a mente é superior aos sentidos; por sua vez, a inteligência é mais elevada do que a mente; e ela [a alma] é superior à inteligência.

Assim, sabendo que é transcendental aos sentidos, à mente e à inteligência materiais, ó Arjuna de braços poderosos, a pessoa deve equilibrar a mente por meio de deliberada inteligência espiritual e, assim — pela força espiritual — vencer este inimigo insaciável conhecido como luxúria.

oṁ tat sat

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